O Homem de Retalhos
O início desta história inusitada data por volta de 1922, nos tempos da construção do ramal Paranapanema, entre Quatiguá e Joaquim Távora, época em que muita gente afluiu para a região em busca de emprego e oportunidade.
Meu bisavô e imigrante italiano, Enrico Tressoldi, trabalhava como operário naquela obra, cavoucando terras e nivelando a estrada; literalmente, construindo o traçado da futura ferrovia. E isso ele fazia junto de outros homens vindos de várias localidades, que se habituavam facilmente com o barulho das ferramentas e o canto dos pássaros, tão abundantes naquela época, devido a ainda existência de grandes florestas que mais tarde seriam derrubadas para a extração de madeira e também para a labuta agropecuária.
Certa tarde, três companheiros de trabalho, vendo
laranjas maduras em um pomar localizado a cerca de trezentos metros ao norte do
atual viaduto, com água na boca e um pouco de fome, resolveram furtar algumas
laranjas.
O sol ainda estava alto quando, entre os galhos
das laranjeiras, viram, ao longe e se aproximando, algo diferente de tudo o que
já tinham visto na vida e se movia rápido atravessando as terras daquela
fazenda.
Era um homem de estatura gigantesca, de aproximadamente
oito metros de altura, a pele feita de
pano, o corpo desgrenhado como um boneco de trapos ou retalhos. O ser caminhava
firme, na direção dos ladrões.
Com a consciência pesada pelo furto, embora
insignificante, e com aquele ser, certamente sobrenatural, pensaram que era um
acerto de contas pelas laranjas pegas sem permissão.
Então o medo tomou conta deles. Desceram das árvores como puderam, pulando, arranhando-se, escorregando-se e caindo. Antes mesmos que eles tivessem conseguido descer totalmente, o ser, que mais parecia um poste que tinha ganhado corpo, já estava a cerca de dois metros próximo às laranjeiras.
Aí eles se apavoraram e gritaram e correram tanto
que o tecido de suas camisas se movimentava freneticamente pela velocidade que corriam.
Quando chegaram até o posto de trabalho que tinham abandonado, tentavam contar
o fato à Enrico, porém ficaram resmungando sons sem nexo e não soltavam a voz...
Até que, vinte minutos depois, quando acalmados por Enrico, contaram ao colega
imigrante o que viram.
Desde esse fato, passaram-se seis anos, a linha
férrea já havia sido construída e Enrico se estabeleceu no bairro Jacaré de
Cima numa propriedade rural localizada entre os municípios de Siqueira
Campos e Quatiguá.
Precisou Enrico buscar algumas coisas na estação
de Afonso Camargo, atual Joaquim Távora, além de comprar alguns poucos víveres
necessários.
Terminada sua tarefa, na por volta das quatro da
tarde, Enrico seguia de volta a seu sítio de Afonso Camargo
para Quatiguá.
Montado em um cavalo marrom, quando avistou à encruzilhada da estrada que
chega até a chácara do Peixinho, sem qualquer aviso prévio, viu
o que só poderia ser o mesmo homem de pano, vindo
por aquela estrada.
Enrico, instintivamente puxou as rédeas e cutucou
com os calcanhares das botas o cavalo para que este seguisse um galope rápido,
porém, o animal se recusava a ir rápido, e quanto mais Enrico tentava apressar
o animal, mais lento ele ia.
Aquele medo acompanhado de arrepio pelo
desconhecido, a aceleração do coração e o desespero pela lentidão do equino se
fez presente, mas também, uma coragem tênue lhe dizia que não podia recuar. Colocou
os pensamentos em Deus e pensou que o que quer que fosse aquele ser o
respeitava e não o afrontava. Se submetia mentalmente à aparição, pois tudo que
não queria era uma afronta direta com o que quer que fosse aquilo.
Quando, entre angustias medos e autoafirmações de
ordem a si mesmo para não surtar, finalmente, transpôs o eixo da encruzilhada o
Homem de Retalhos passou em linha reta próxima a garupa de seu cavalo e
continuou a trajetória sem incomodar Enrico ou o animal e sem pronunciar
qualquer som.
Enrico nem quis olhar direto para aquele ser, nem
olhar para trás, simplesmente conseguiu acelerar o cavalo e foi o mais rápido
possível para a sua casa, rezando para que conseguisse chegar em casa antes de
anoitecer.
Enrico imediatamente lembrou daquela história dos
furtadores de laranja, embora esta aparição tenha acontecido a aproximadamente oitocentos
metros da primeira aparição.
Chegando em casa contou tudo a sua esposa Irma e
a seus filhos. Enrico nunca se esqueceu desse episódio enquanto viveu e, volta
e meia, o relatava para parentes e amigos.
O tempo passou, a história virou lembrança,
depois cochicho e, por fim, quase lenda, um causo.
Mas no início dos
anos oitenta, aproximadamente em 1982. Umas oito horas noite, João Vargas,
conhecido como João Boi, amigo de meu pai, José Balestra Tressoldi, conhecido
como Zé Gordo, perguntou a José se tinha uma leitoa para vender, pois estava
com vontade de assar uma leitoa para comer.
José disse que tinha a leitoa, mas que não ia
vender, ia dá-la, pois queria também saborear com o amigo a carne assada do
animal.
Assim decidido, adentraram na picape
Willys 67 de meu pai e foram de Joaquim Távora, até a chácara de
propriedade de José que atualmente é propriedade de Sílvio Garcia e se localiza
atrás da ração pioneira.
Isso era nove horas da noite, ao se aproximar da encruzilhada
da estrada da chácara do Peixinho, o farol da camionete iluminou a estrada e ambos
viram um homem gigantesco, agora não com os aspecto de feito de retalhos por
causa da noite, mas com o aspecto de sombra, os dois nem sequer esboçaram
palavras, engoliram seco, se arrepiaram e se entreolharam, ao que José sentou o
pé na tábua, estavam ainda a 50 metros da encruzilhada e o homem parecia estar
a uns cem metros de distância, quando a camionete cruzou a encruzilhada o homem
passou imediatamente atrás da camionete.
Isso provocou um medo estranho nos dois, foram pegar
a leitoa, mas rezavam para não cruzar com aquele gigante novamente. Evitaram
falar no assunto por alguns dias devido ao impacto da visão, depois que
assimilaram teciam comentários sobre o que seria aquilo.
Isso não é um conto ou uma história fantasiada, é
um relato curioso que envolveu 6 pessoas ao longo do tempo. O que poderia ser,
um ser de outro mundo, uma espécie desconhecida, um aviso de uma força oculta?
Ou alguma outra possibilidade?
Não se sabe a resposta, o que se sabe é que tal
visagem ocorreu e ocorreu naquela parte do município de Joaquim Távora.
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